Desapropriação Indireta

Calcado em sua própria soberania, de fato o Estado tem o direito de desapropriar bem pertencente ao particular, mediante prévia e justa indenização. Porém essa transferência compulsória da propriedade particular para o Poder Público deve, em regra, ser promovida judicialmente, inclusive com oferta de preço acompanhando a petição inicial, dentro dos conformes do artigo 13 do decreto-lei 3.365/41.

Esse instituto jurídico pode ser fundamentado em três categorias: político, constitucional e legal. O fundamento político se refere à prioridade do interesse público sobre o privado em casos de conflito. O fundamento constitucional está previsto nos artigos 5°, inciso XXIV; artigo 182, §4°, inciso III; e o artigo 184 da Constituição Federal. Já o fundamento legal está presente em várias leis, incluindo o Decreto-lei nº 3.365/41 (sobre desapropriação), a Lei nº 4.132/62 (sobre desapropriação por interesse social), o Decreto-lei nº 1.075/70 (sobre imissão provisória na posse de imóveis residenciais urbanos), a Lei Complementar 76/93 (sobre desapropriação de imóvel rural para reforma agrária) e a Lei nº 10.257/01 (Estatuto das Cidades).

Para iniciar a desapropriação, o Poder Público deve emitir uma declaração expropriatória, indicando o bem e sua destinação pública ou interesse social. Em seguida, o bem é transferido ao expropriante, e a justa indenização é estabelecida. A primeira etapa consiste na declaração expropriatória, justificando os motivos de utilidade pública ou interesse social e a segunda etapa, a execução.

A fase declaratória começa com a expedição do decreto expropriatório ou a publicação de uma lei específica. Normalmente, a desapropriação é iniciada pelo decreto expropriatório emitido pelo Presidente da República, Governador, Interventor ou Prefeito (art. 6º do Decreto-Lei nº 3.365/41). O decreto expropriatório é um ato do Chefe do Poder Executivo que declara a destinação do bem expropriado, autoriza a entrada no imóvel e inicia o prazo de caducidade.

O prazo de caducidade varia: cinco anos para declarações baseadas em necessidade ou utilidade pública e dois anos para declarações baseadas em interesse social. A desapropriação deve ser efetivada por acordo ou judicialmente dentro de dois ou cinco anos, conforme o fundamento da declaração.

Assim sendo, o prazo começa com a expedição do decreto e se encerra após cinco anos para necessidade ou utilidade pública; após dois anos para interesse social, conforme estabelecido no artigo 10 do Decreto-Lei nº 3.365/1941 e no artigo 3º da Lei nº 4.132/1962, respectivamente. Porém isso não significa que o Estado perde o poder de desapropriar o bem, uma nova declaração pode ser feita desde que tenha passado um ano após a caducidade.

Quando o interesse no imóvel é manifestado por meio do decreto expropriatório, inicia-se a fase executória, onde o Poder Expropriante toma medidas concretas para integrar o bem ao domínio público. Primeiro, é feita uma oferta pelo bem e caso o proprietário aceite, a propriedade é transferida amigavelmente. Se o valor oferecido for recusado, a fase administrativa termina e inicia-se a fase judicial com a ação de desapropriação pelo Poder Público. Ou seja, há duas maneiras: extrajudicial ou judicial:

a)Extrajudicial: Ocorre quando há acordo entre o poder expropriante e o proprietário sobre o valor da indenização, permitindo a aquisição compulsória sem a intervenção do Judiciário.

b)Judicial: Acontece quando o expropriante entra com uma ação expropriatória. Podendo ser homologatória, o juiz apenas homologa o acordo, após o proprietário aceitar a oferta em juízo; ou contenciosa, caso não haja acordo, o preço é determinado pelo juiz após o arbitramento.

A indenização é indispensável para equilibrar o interesse público e o privado. O proprietário perde a propriedade e, como compensação, recebe um valor em dinheiro ou, em alguns casos, títulos da dívida pública.

A indenização justa geralmente inclui não apenas o valor real do bem desapropriado, mas também os danos emergentes e lucros cessantes resultantes da transferência de propriedade, além de juros compensatórios, juros moratórios, correção monetária, custas processuais, e honorários de advogado e assistente técnico.

Todavia, não raras as vezes em que o Poder Público efetua a desapropriação e o apossamento de terras sem a contraprestação devida, tampouco com o processo legal necessário. Nessa caso, medidas judiciais como a ação de desapropriação indireta são necessárias à obtenção da contraprestação devida.

Também chamada de desapossamento administrativo, a desapropriação indireta ocorre quando o poder público se apossa de um bem sem o consentimento do proprietário, além de não seguir o devido processo legal. Isso resulta em uma ação judicial, denominada ação ordinária de indenização por desapossamento administrativo ou desapropriação indireta. Nesse caso, o proprietário é o autor da ação, e o poder público, o réu.

A desapropriação indireta é considerada um esbulho de propriedade particular e não possui amparo legal. É uma situação de fato que tem se tornado comum, mas contra a qual o proprietário pode se opor, inclusive com interditos possessórios.

Também ocorre desapropriação indireta quando as limitações ou servidões impostas a uma propriedade são tão restritivas que o proprietário perde completamente o domínio sobre o bem, ao invés de apenas parcialmente como originalmente proposto. Contudo, o proprietário prejudicado pela ação do ente estatal tem o direito de pleitear indenização pelas perdas e danos decorridos pela desapropriação indireta. Bem como os proprietários que estiverem sofrendo restrições excessivas sobre sua propriedade quando apossada para servir o interesse público sem o devido processo legal.

A ação de indenização visa recompensar a perda da propriedade, pois o bem incorporado pelo Poder Público se torna irreversível para o antigo proprietário. O autor deve ser o proprietário do imóvel e provar seu domínio, sob pena de não ser parte legítima na ação. Se o autor for casado, a jurisprudência exige a participação de ambos os cônjuges no polo ativo da ação, sob pena de extinção do processo.

Com base no entendimento do STJ, deve-se analisar o prazo prescricional aplicável para a ação de indenização por desapropriação indireta. Se o Poder Público apenas intervir no imóvel sem destiná-lo a uma necessidade ou utilidade pública, aplica-se o prazo de quinze anos do artigo 1.238 caput do Código Civil. No entanto, se forem realizadas benfeitorias no imóvel para a coletividade, dentro dos moldes de necessidade, utilidade pública ou interesse social, o prazo será de dez anos, conforme o parágrafo único do artigo 1.238 do Código Civil de 2002.

À vista disso, em relação à desapropriação indireta, o que se verifica é a ação injusta do ente estatal, calcada em sua própria soberania. E embora haja a devida indenização após o seu esbulho, resta pouco ao cidadão que, além de todo o estresse, presencia o seu bem ser tomado de maneira ilícita, não podendo, por lei, reivindicá-lo ⎯ uma “ilegalidade legal”. Contar com uma boa assessoria jurídica é indispensável para mitigar os danos oriundos do referido ato.

Por ANDREA ROCHA

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  • Advogada, sócia fundadora do escritório Domenico Advogados, Especialista em Direito Público e Eleitoral, atua principalmente nas áreas de Direito Tributário, Empresarial e Agronegócio.
  • Presidente do Instituto dos Advogados do Distrito Federal – IADF (2023-2026).
  • Diretora da Federação Nacional dos Institutos dos Advogados do Brasil – FENIA (2024).
  • Vice-Presidente do Instituto Justiça, Paz e Felicidade.
  • Coautora do livro Questões Tributárias, Empresariais e Contemporâneas do Direito.
  • Autora do Livro Cultura Organizacional e Compliance (aguardando publicação).
  • Professional Executive e Leader Coach – IAC e EMECC.
  • MBA em Gestão Empresarial – FESPSP.
  • Cidadã Italiana
  • Advogado, sócio fundador do escritório Domenico Advogados, com atuação nos Tribunais Superiores há mais de 20 anos; Doutor e Mestre em Direito Constitucional, Especialista em Direito Público e Eleitoral, atua principalmente nas áreas de Direito Tributário, Empresarial e Agronegócio.
  • Desembargador Eleitoral – Tribunal Regional Eleitoral – TRE/DF (2017/2019);
  • Juiz da Propaganda – Tribunal Regional Eleitoral – TRE/DF (Eleições Gerais – 2018);
  • Juiz de Paz (2023 até hoje);
  • Presidente do Fórum Justiça, Paz e Felicidade – JPF;
  • Diretor da Associação Nacional dos Magistrados Evangélicos – ANAMEL;
  • Diretor do Instituto dos Juízes de Paz (iJUPAZ);
  • Diretor, por três mandatos, do Instituto dos Advogados do DF – IADF;
  • Membro do Colégio Permanente de Juristas Eleitorais – COPEJE;
  • Membro da Associação Nacional de Escritores – ANE;
  • Membro da Comunidade das Nações.
  • Conselheiro Seccional, por dois mandatos da OAB/DF e Presidente da Comissão de Assuntos Legislativos;
  • Autor das obras jurídico literárias: Decisões Eleitorais; Propaganda Eleitoral: a Dimensão da Liberdade de Expressão; e Justiça, Paz e Felicidade: O Poder das Virtudes;
  • Coautor: Revista de Jurisprudência do Colégio Permanente de Juristas da Justiça Eleitoral – COPEJE – 1ª Edição; Biografias 2022 – ANAMEL; Revista do Instituto dos Advogados do Distrito Federal – 4ª e 5ª Edição; Questões Tributárias, Empresariais e Contemporâneas do Direito.
  • Cidadão honorário de Brasília/DF, Cidadão Honorário de Primavera do Leste/MT e Cidadão Italiano.